terça-feira, 17 de abril de 2012

A GUERRA DO ABORTO E OS GUETOS NA INTERNET

Existem alguns textos na vida que você gostaria de ter escrito, da uma inveja de quem o fez. E esse que irei postar abaixo é um belo exemplo disso:

Por Rafael Rodrigues

Ontem, ao abrir meu twitter pela manhã, fui surpreendido por uma timeline recheada de tuites sobre o mesmo tema: aborto. Fui analisar o debate e pude perceber a existência de três trincheiras nesse campo de batalha: os pró-aborto, os contra e, obviamente, os trolls que sempre estão ali para tirar sarro de qualquer discussão existente na internet. Lendo os tuites fui percebendo algo que há tempos tenho visto na minha geração: uma proliferação em grande escala dos guetos nas comunidades virtuais.


Creio que há um engano na afirmação: “internet é um lugar onde procuramos conhecer pessoas de todas as culturas”. Isso não é verdade. A internet me parece muito mais uma extensão do nosso quintal de opiniões do que propriamente um lugar onde se conhece várias delas.

Por mais que as pessoas estejam num espaço onde há milhões de opiniões diferentes como a internet, elas sempre estarão mais propensas a procurar os de semelhante opinião e descartar os opositores. Por exemplo, se um cara de direita quiser estudar sobre o que é socialismo, ele irá procurar informações em sites como a Veja, Globo.com. Obviamente, as informações que ele obterá serão parciais, mas serão satisfatórias para quem procura. E assim os semelhantes vão se juntando e formando guetos na internet para partilharem assim dos mesmos pontos de vista.

O que isso significa? Significa que se o cara tiver um Twitter, ele só irá seguir pessoas que tenham a mesma opinião que ele. Significa que se ele tiver um Facebook, as páginas que ele vai curtir estarão intimamente ligadas com aquilo que ele acredita.

O problema desses guetos é a ilusão de que só porque a sua timeline está dizendo a mesma coisa referente ao mesmo assunto é porque a grande maioria da sociedade concorda com aquilo. Por exemplo, a pessoa é homofóbica e no seu twitter só segue gente que partilha dessa opinião. Certamente, essa pessoa terá a ilusão de que a sociedade inteira é homofóbica assim como ele.

Aí quando este rapaz sai para rua e encontra um homossexual, qual seria a reação lógica dele? Reprimir aquela pessoa, afinal, a sociedade em sua maioria concorda que a homossexualidade é errado (olhando assim não é difícil entender como uma pessoa sai em plena Avenida Paulista com uma lâmpada na mão para agredir um casal de homossexuais).

Ou seja, os guetos estão aí na internet mais para intensificar as suas convicções do que para dialogar com as diferentes opiniões. Por que tentar entender o outro lado se afinal é o nosso que está sempre certo?
E nessa ideologia os guetos se enfrentam, quebram pau e levam a briga pro octógono da internet: os trending topics. O que se vê ali é quase sempre uma briga de quem consegue subir a tag “mais forte” na esperança que “a voz do povo seja a voz de Deus”. E foi isso que eu vi no debate sobre o aborto. Nenhum dos lados queria ouvir o outro, apenas atacar. Os pró-aborto chamavam os anti-aborto de “religiosos babacas” e o inverso chamando-os de “assassinos”. Poucos ali estavam realmente dispostos a discutir a lei e ver quais seriam os benefícios e possíveis malefícios dela.

Estamos na época mais conservadora de nossa História.

Antigamente, por mais que nós tivéssemos opiniões diferentes do nosso vizinho, nós tínhamos que abrir concessões e nos adaptar aos códigos sociais que garantiam uma convivência amigável. Hoje, se você não quiser ouvir alguém basta dar unfollow e só ouvir aquilo que te convém. Não é necessário agir de forma amigável na internet – o que dá vazão a uma nova era de intolerância e desrespeito.

A internet nos ensinou a ter voz e esse foi o um passo importante para a Humanidade, resta agora aprendermos a ter ouvidos para ouvir a todos, principalmente aqueles que pensam diferente de nós.

FONTE: http://youpix.com.br/colunistas/a-guerra-do-aborto-e-os-guetos-na-internet/